Posso Errar? - Leila Ferreira - Há pouco tempo fui obrigada a lavar meus cabelos com o xampu “errado”.Foi num hotel, onde cheguei pouco antes de fazer uma palestra e, depois de ver que tinha deixado meu xampu em casa, descobri que não havia farmácia nem shopping num raio de 10 quilômetros . A única opção era usar o dois-em-um (xampu com efeito condicionador) do kit do hotel. Opção? Maneira de dizer. Meus cabelos, superoleosos, grudam só de ouvir a palavra “condicionador”. Mas fui em frente. Apliquei o produto cautelosamente, enxaguei, fiz a escova de praxe e... Surpresa! Os cabelos ficaram soltos e brilhantes — tudo aquilo que meus nove vidros de xampu “certo” que deixei em casa costumam prometer para nem sempre cumprir. Foi aí que me dei conta do quanto a gente se esforça para fazer a coisa certa, comprar o produto certo, usar a roupa certa, dizer a coisa certa — e a pergunta que não quer calar é: certa pra quem? Ou: certa por quê? O homem certo, por exemplo: existe ficção maior do que essa? Minha amiga se casou com um exemplar da espécie depois de namorá-lo sete anos. Levou um mês para descobrir que estava com o marido errado. Ele foi “certo” até colocar a aliança. O que faz surgir outra pergunta: - Certo até quando? - Porque o certo de hoje pode se transformar no equívoco monumental de amanhã. Ou o contrário: existem homens que chegam com aquele jeito de “nada a ver”, vão ficando e, quando você se assusta, está casada — e feliz — com um deles. E as roupas? Quantos sábados você já passou num shopping procurando o vestido certo e os sapatos certos para aquele casamento chiquérrimo e, na hora de sair para a festa, você se olha no espelho e tem a sensação de que está tudo errado? As vendedoras juraram que era a escolha perfeita, mas talvez você se sentisse melhor com uma dose menor de perfeição. Eu mesma já fui para várias festas me sentindo fantasiada. Estava com a roupa “certa”, mas o que eu queria mesmo era ter ficado mais parecida comigo mesma, nem que fosse para “errar”. Outro dia fui dar uma bronca numa amiga que insiste em fumar, apesar dos problemas de saúde, e ela me respondeu: “Eu sei que está errado, mas a gente tem que fazer alguma coisa errada na vida, senão fica tudo muito sem graça. O que eu queria mesmo era trair meu marido, mas isso eu não tenho coragem. Então eu fumo”. Sem entrar no mérito da questão — da traição ou do cigarro —, concordo que viver é, eventualmente, poder escorregar ou sair do tom. O mundo está cheio de regras, que vão desde nosso guarda-roupa, passando por cosméticos e dietas, até o que vamos dizer na entrevista de emprego, o vinho que devemos pedir no restaurante, o desempenho sexual que nos torna parceiros interessantes, o restaurante que está na moda, o celular que dá status, a idade que devemos aparentar. Obedecer, ou acertar, sempre é fazer um pacto com o óbvio, renunciar ao inesperado. O filósofo Mario Sergio Cortella conta que muitas pessoas se surpreendem quando constatam que ele não sabe dirigir e tem sempre alguém que pergunta: “Como assim?! Você não dirige?!”. Com toda a calma, ele responde: “Não, eu não dirijo. Também não boto ovo, não fabrico rádios — tem um punhado de coisas que eu não faço”. Não temos que fazer tudo que esperam que a gente faça nem acertar sempre no que fazemos. Como diz Sofia, agente de viagens que adora questionar regras: “Não sou obrigada a gostar de comida japonesa, nem a ter manequim 38 e, muito menos, a achar normal uma vida sem carboidratos”. O certo ou o “certo” pode até ser bom. Mas às vezes merecemos aposentar régua e compasso. Leila Ferreira é jornalista, apresentadora de TV e autora do livro "Mulheres – Por que será que elas...", da Editora Globo |
segunda-feira, 26 de abril de 2010
Foto by Sandra Hasmann
quarta-feira, 21 de abril de 2010
Juventude, Meio Ambiente e a complexidade socioambiental
"As pessoas precisam compreender a complexidade das relações socioambientais”
As pessoas precisam compreender “o que é meio ambiente” e a complexidade das
relações socioambientais. Como a água, os alimentos e grandes obras de infraestrutura
estão conectados com as florestas, energia, transportes e as pessoas? Todos esses elementos
e temas estabelecem relações uns com os outros, e a visão superficial dessas conexões é um
problema. A compreensão profunda dessa teia viva de relações ainda é falha em toda a
sociedade. Primeiro é preciso compreender essa complexidade, em seguida internalizar que
nossas ações e práticas cotidianas também estão inseridas nesse sistema, ou seja, somos
todos responsáveis por tudo o que ocorre conosco, com a sociedade e com o ambiente que
nos cerca.
A educação ambiental tem um importante papel para o alcance deste despertar. A
ampliação da compreensão do mundo só se dará por meio de um processo de educação
ambiental que de fato trabalhe a percepção da complexidade e da responsabilidade de cada
um de nós e de todos nós juntos. Resgatar princípios e valores é essencial para a mudança
de práticas e hábitos. É importante cuidado, pois muito se fala e faz de educação ambiental
de forma superficial pelo país afora. Não podemos reduzir a educação ambiental à
reciclagem, ao dia do meio ambiente ou a semana da árvore. É preciso uma educação
ambiental permanente, crítica e transformadora.
Até nos governos falta essa percepção complexa. Isso é nítido na visão
desenvolvimentista na qual o crescimento econômico é o herói de todos os problemas do
país e sua população. Desenvolvimento é também qualidade de vida e cuidado com meio
ambiente e com a biodiversidade. Observa-se a marginalização da pauta ambiental ao invés
de sua priorização. O ambiente deve ser o tema central, estruturante de todas as políticas.
Já existem tecnologias e alternativas, faltam investimentos e vontade política. O que está
em jogo é a sobrevivência de todos os seres vivos do planeta.
São necessárias ações interministeriais, integradas entre sociedade, setor privado e
governos municipais, estaduais e federal.
“é papel do movimento ambientalista inserir ainda mais os jovens em seus debates,
ações e contribuir com a formação e a construção de capacidades, assim os jovens
estarão mais preparados para dar continuidade a luta socioambiental”.
Os jovens são importantes sujeitos para a transformação da realidade e estão
trabalhando fortemente com educação ambiental A juventude tem vários modos de
trabalhar, existem várias linhas de ação que cada um adota no movimento que atua, seja
ambientalista, estudantil ou partidário. O que nacionalmente existe mais consolidado é a
educação ambiental. Visualiza-se um avanço do movimento da juventude pelo meio
ambiente, busca-se a criação de agendas comuns e a ampliação da compreensão
entendimento sobre questões técnicas. A transposição do São Francisco, por exemplo,
somos contra ou a favor? Ok, somos contra, mas por quê? Argumentos consistentes e
técnicos são importantes para podermos nos posicionar.
A juventude está se organizando pela Rede da Juventude pelo Meio Ambiente e
Sustentabilidade (Rejuma), nos Coletivos Jovens de Meio Ambiente, existentes em todos os
estados do Brasil, e nos movimentos estudantis, socioambientais e juvenis. Em parceria
com o Órgão Gestor da Política Nacional de Educação Ambiental muitos jovens atuaram
no processo da I e II Conferências Infanto-Juvenis pelo Meio Ambiente. Essa parceria foi
importante para estimular e possibilitar o encontro de jovens ambientalistas dos quatro
cantos do país.
Praticar educação ambiental nos leva a reflexão cotidiana de princípios, valores e
hábitos. O sistema coloca contradições diariamente na vida de todos e todas, e sabe-se a
força e importância do nosso consumo na teia de relações complexas do ambiente que nos
cerca. Consumo responsável, aí está outro tema presente nas ações e discussões dos jovens
ambientalistas do Brasil.
“Um desafio para o movimento da juventude pelo meio ambiente é fortalecer a pauta
ambiental nos movimentos de juventude”.
Um desafio do movimento da juventude pelo meio ambiente é fortalecer a pauta
ambiental nos movimentos de juventude, assim como fortalecer a pauta juvenil no
movimento ambientalista. ONGs de jovens, que trabalham com cultura, primeiro emprego e
cotas nas universidades, hip-hop, entre outros, precisam ampliar o debate sobre questões
ambientais. Observa-se na criação do Conselho Nacional da Juventude e em conselhos
estaduais e municipais uma série de jovens organizados que estão articulados e
influenciando nas políticas públicas. A pauta ambiental precisa ser fortalecida em todos
esses conselhos e movimentos. A juventude é sim um importante sujeito para a
implementação dessas políticas. A magia dos jovens está na energia, motivação e
inquietação.
É preciso aprofundar a compreensão da sociedade sobre meio ambiente, ampliar a
participação da juventude nos debates, ações e movimentos socioambientais. É também
fundamental o aprimoramento da participação da sociedade nos espaços de decisão e
implementação de políticas públicas. O movimento ambientalista necessita de integração,
união de forças, estratégias, campanhas e ações conjuntas, sinergia nos discursos e práticas.
Carolina Campos é jornalista e educadora ambiental.
* Por Carolina Campos
"As pessoas precisam compreender a complexidade das relações socioambientais”
As pessoas precisam compreender “o que é meio ambiente” e a complexidade das
relações socioambientais. Como a água, os alimentos e grandes obras de infraestrutura
estão conectados com as florestas, energia, transportes e as pessoas? Todos esses elementos
e temas estabelecem relações uns com os outros, e a visão superficial dessas conexões é um
problema. A compreensão profunda dessa teia viva de relações ainda é falha em toda a
sociedade. Primeiro é preciso compreender essa complexidade, em seguida internalizar que
nossas ações e práticas cotidianas também estão inseridas nesse sistema, ou seja, somos
todos responsáveis por tudo o que ocorre conosco, com a sociedade e com o ambiente que
nos cerca.
A educação ambiental tem um importante papel para o alcance deste despertar. A
ampliação da compreensão do mundo só se dará por meio de um processo de educação
ambiental que de fato trabalhe a percepção da complexidade e da responsabilidade de cada
um de nós e de todos nós juntos. Resgatar princípios e valores é essencial para a mudança
de práticas e hábitos. É importante cuidado, pois muito se fala e faz de educação ambiental
de forma superficial pelo país afora. Não podemos reduzir a educação ambiental à
reciclagem, ao dia do meio ambiente ou a semana da árvore. É preciso uma educação
ambiental permanente, crítica e transformadora.
Até nos governos falta essa percepção complexa. Isso é nítido na visão
desenvolvimentista na qual o crescimento econômico é o herói de todos os problemas do
país e sua população. Desenvolvimento é também qualidade de vida e cuidado com meio
ambiente e com a biodiversidade. Observa-se a marginalização da pauta ambiental ao invés
de sua priorização. O ambiente deve ser o tema central, estruturante de todas as políticas.
Já existem tecnologias e alternativas, faltam investimentos e vontade política. O que está
em jogo é a sobrevivência de todos os seres vivos do planeta.
São necessárias ações interministeriais, integradas entre sociedade, setor privado e
governos municipais, estaduais e federal.
“é papel do movimento ambientalista inserir ainda mais os jovens em seus debates,
ações e contribuir com a formação e a construção de capacidades, assim os jovens
estarão mais preparados para dar continuidade a luta socioambiental”.
Os jovens são importantes sujeitos para a transformação da realidade e estão
trabalhando fortemente com educação ambiental A juventude tem vários modos de
trabalhar, existem várias linhas de ação que cada um adota no movimento que atua, seja
ambientalista, estudantil ou partidário. O que nacionalmente existe mais consolidado é a
educação ambiental. Visualiza-se um avanço do movimento da juventude pelo meio
ambiente, busca-se a criação de agendas comuns e a ampliação da compreensão
entendimento sobre questões técnicas. A transposição do São Francisco, por exemplo,
somos contra ou a favor? Ok, somos contra, mas por quê? Argumentos consistentes e
técnicos são importantes para podermos nos posicionar.
A juventude está se organizando pela Rede da Juventude pelo Meio Ambiente e
Sustentabilidade (Rejuma), nos Coletivos Jovens de Meio Ambiente, existentes em todos os
estados do Brasil, e nos movimentos estudantis, socioambientais e juvenis. Em parceria
com o Órgão Gestor da Política Nacional de Educação Ambiental muitos jovens atuaram
no processo da I e II Conferências Infanto-Juvenis pelo Meio Ambiente. Essa parceria foi
importante para estimular e possibilitar o encontro de jovens ambientalistas dos quatro
cantos do país.
Praticar educação ambiental nos leva a reflexão cotidiana de princípios, valores e
hábitos. O sistema coloca contradições diariamente na vida de todos e todas, e sabe-se a
força e importância do nosso consumo na teia de relações complexas do ambiente que nos
cerca. Consumo responsável, aí está outro tema presente nas ações e discussões dos jovens
ambientalistas do Brasil.
“Um desafio para o movimento da juventude pelo meio ambiente é fortalecer a pauta
ambiental nos movimentos de juventude”.
Um desafio do movimento da juventude pelo meio ambiente é fortalecer a pauta
ambiental nos movimentos de juventude, assim como fortalecer a pauta juvenil no
movimento ambientalista. ONGs de jovens, que trabalham com cultura, primeiro emprego e
cotas nas universidades, hip-hop, entre outros, precisam ampliar o debate sobre questões
ambientais. Observa-se na criação do Conselho Nacional da Juventude e em conselhos
estaduais e municipais uma série de jovens organizados que estão articulados e
influenciando nas políticas públicas. A pauta ambiental precisa ser fortalecida em todos
esses conselhos e movimentos. A juventude é sim um importante sujeito para a
implementação dessas políticas. A magia dos jovens está na energia, motivação e
inquietação.
É preciso aprofundar a compreensão da sociedade sobre meio ambiente, ampliar a
participação da juventude nos debates, ações e movimentos socioambientais. É também
fundamental o aprimoramento da participação da sociedade nos espaços de decisão e
implementação de políticas públicas. O movimento ambientalista necessita de integração,
união de forças, estratégias, campanhas e ações conjuntas, sinergia nos discursos e práticas.
Carolina Campos é jornalista e educadora ambiental.
segunda-feira, 19 de abril de 2010
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quarta-feira, 14 de abril de 2010
APRENDA A CHAMAR A POLÍCIA... (Luiz Fernando Veríssimo) Eu tenho o sono muito leve, e numa noite dessas notei que havia alguém andando sorrateiramente no quintal de casa. Levantei em silêncio e fiquei acompanhando os leves ruídos que vinham lá de fora, até ver uma silhueta passando pela janela do banheiro. Como minha casa era muito segura, com grades nas janelas e trancas internas nas portas, não fiquei muito preocupado, mas era claro que eu não ia deixar um ladrão ali,espiando tranqüilamente. Liguei baixinho para a polícia, informei a situação e o meu endereço. Perguntaram-me se o ladrão estava armado ou se já estava no interior da casa. Esclareci que não e disseram-me que não havia nenhuma viatura por perto para ajudar, mas que iriam mandar alguém assim que fosse possível. Um minuto depois liguei de novo e disse com a voz calma: -Oi, eu liguei há pouco porque tinha alguém no meu quintal. Não precisa mais ter pressa. Eu já matei o ladrão com um tiro da escopeta calibre 12, que tenho guardada em casa para estas situações. O tiro fez um estrago danado no cara! Passados menos de três minutos, estavam na minha rua cinco carros da polícia, um helicóptero, uma unidade do resgate, uma equipe de TV e a turma dos direitos humanos, que não perderiam isso por nada neste mundo. Eles prenderam o ladrão em flagrante, que ficava olhando tudo com cara de assombrado. Talvez ele estivesse pensando que aquela era a casa do Comandante da Polícia. No meio do tumulto, um tenente se aproximou de mim e disse: -Pensei que tivesse dito que tinha matado o ladrão. Eu respondi: - Pensei que tivesse dito que não havia nenhuma viatura disponível. |
domingo, 11 de abril de 2010

(recebi por email e não poderia deixar de compartilhar)
"A natureza não mata apenas com enchentes, deslizamentos, terremotos e tsunamis. Mata também pelas mãos do homem, o que é bem mais preocupante"
- Lya Luft -
Menina do interior, tive a natureza como presença enorme em torno da casa e por toda a pequena cidade: paisagem, abrigo, fascinação, surpresa, escola de permanência e também de transitoriedade. Mantive um laço estreito com esse universo, e quando posso durmo de janelas e cortinas abertas, para sentir a respiração do mundo. Porém, cedo também aprendi que a mãe natureza pode ser cruel. Granizo perfurando folhas e arrasando a horta, geada castigando flores, raios matando gente. De longe, ouvia falar em terremoto, quando o vasto mundo ainda era distante. Agora que o mundo ficou minúsculo, porque o Haiti arrasado, o Chile destruído e a Europa nevada estão ao alcance do meu dedo no computador ou no controle da televisão, a velha mãe se manifesta em estertores que podem ser apenas normais (o clima da Terra sempre mudou, às vezes radicalmente, antes de virmos povoar este planeta), mas também podem ser rosnados de protesto, "ei, o que estão fazendo comigo essas pequenas cracas que se instalaram sobre minha pele?".
Mas a natureza não mata apenas com enchentes, deslizamentos, terremotos e tsunamis. Mata pela mão dos humanos, o que pode parecer um fato em escala menor, mas é bem mais preocupante. Homens, mulheres e meninos-bomba quase diariamente se explodem levando consigo dezenas de vidas inocentes: pais de família, mães ou crianças, mulheres fazendo a feira, jovens indo para a escola. Bandidos incendeiam um ônibus com passageiros dentro: dois morrem logo, outros vários curtem em hospitais o grave sofrimento dos queimados. Não tinham nada a ver com a bandidagem, estavam apenas indo para o trabalho, ou vindo dele. Assaltantes explodem bancos em cidades do interior antes tranquilas. Criminosos sequestram casais ou famílias inteiras e os submetem aos maiores vexames e terror. Como está virando costume, a gente agradece por escapar com vida.
Duas mães deixam num barraco imundo cinco crianças, algumas com menos de 6 anos. Sem comida, sem força, sem presença, sem a menor higiene. O policial que as encontra leva duas menorzinhas para casa, onde sua mulher lhes dá banho e comida.
As crianças, de tão fracas, mal conseguem se alimentar. O homem chora: tem três filhos pequenos, e há algum tempo perdeu uma filhinha. A maldade humana agride até esse homem que com ela deve ter frequente contato.
As crianças, de tão fracas, mal conseguem se alimentar. O homem chora: tem três filhos pequenos, e há algum tempo perdeu uma filhinha. A maldade humana agride até esse homem que com ela deve ter frequente contato.
A natureza, da qual fazemos parte, mata com muito mais crueldade através de nós do que através do clima ou de movimentos da terra, e de maneira bem mais assustadora: pois nós pensamos enquanto prejudicamos o nosso semelhante. Temos a intenção de atormentar, torturar, matar, mesmo que em vários casos seja uma consciência em delírio – estamos tão drogados que achamos graça de tudo. Mas somos responsáveis por nos termos drogado.
De modo que, como me dizia um amigo, o ser humano não tem jeito, não.
Ou: esse é o nosso jeito, a nossa parte na natureza. De um lado, os cuidadores, que vão de pais e mães até médicos e enfermeiras; do outro lado, os destruidores, que são os bandidos, mas também (que tristeza) eventualmente pais e parentes. E contra eles, tanto ou mais do que contra a natureza não humana, somos impotentes. O que faz a criança diante do abandono materno? Em relação ao pai, tio ou irmão estuprador?
Ou: esse é o nosso jeito, a nossa parte na natureza. De um lado, os cuidadores, que vão de pais e mães até médicos e enfermeiras; do outro lado, os destruidores, que são os bandidos, mas também (que tristeza) eventualmente pais e parentes. E contra eles, tanto ou mais do que contra a natureza não humana, somos impotentes. O que faz a criança diante do abandono materno? Em relação ao pai, tio ou irmão estuprador?
O que fazem passageiros de um ônibus, pacíficos e cansados, diante do terror imposto por bandidos? Nada. Migalhas humanas soterradas por maldade e frieza, como num terremoto ou tsunami somos soterrados pela lama, pelos destroços, pelas águas.
Resta filosofar um pouco: de que vale a vida, quanto vale a minha, e como a usamos, se é que pensamos nisso? Pensar pode ser meio chato, e ainda por cima traz alguma inquietação. A natureza poderosa, encantadora e cruel também somos nós: que a gente não fique do lado dos animais assassinos, como a orca, que depois de matar três pessoas continua, como foi anunciado, "fazendo parte do time", no parque americano.
Antes de usar um adesivo "salve as baleias", eu quero um adesivo "salve as pessoas, que são parte da natureza".
sexta-feira, 2 de abril de 2010
As festas da Bíblia (V): a Páscoa de Jesus
No tempo de Jesus celebravam-se as três grandes festas nacionais (a Páscoa, o Pentecostes, as Tendas), obrigando à peregrinação até ao Templo de Jerusalém, onde se juntavam mais de 100.000 peregrinos, para além dos mercadores de cordeiros e de outros animais para o sacrifício. Então, seguia-se o antigo ritual da Páscoa dos pastores e dos agricultores.

Deste modo, a 10 de Nisã (Março-Abril), as famílias compravam um cordeiro (Ex 12,3) e na noite de 13 para 14 limpavam as casas de todo o pão com fermento, para, no dia seguinte, ao meio-dia, começarem com a preparação da Páscoa, cessando todo o trabalho. Nesse dia 14, entre as 14,30 e as 17,00 horas, os homens entravam no pátio do Templo com um cordeiro que eles mesmos matavam, nos lugares apropriados, enquanto os sacerdotes recolhiam o sangue em vasos que era levado ao altar e aí derramado. As gorduras do cordeiro eram queimadas no altar dos holocaustos, enquanto os levitas, num estrado mais elevado, cantavam os Salmos do Hallel (Salmos 113 a 118). O homem que trouxera o cordeiro levava-o aos ombros para casa, para o assar e comer no banquete pascal, que começava com o aparecimento da primeira estrela.
No dia 15 era a Páscoa propriamente dita e nessa noite começava a festa dos Ázimos com o descanso (que terminava no dia seguinte à noite) e a oferta própria ao Templo. A festa dos Ázimos tinha o seu fim a 21 de Nisã à noite, que também era dia de repouso.
Nem todas as famílias conseguiam ter um cordeiro para imolar e comer e, por isso, juntavam-se várias famílias, convidavam amigos e pessoas pobres, ou juntavam-se pessoas sem grau de parentesco formando "famílias", como foi o caso de Jesus com os seus discípulos para celebrarem a Páscoa (Mt. 26.17-19; Mc 14,12-16; Lc 22,7-13).
No tempo de Jesus alguns dos antigos costumes haviam-se perdido, como o caso das vestes de caminhante (pastor). Comia-se à maneira grega ou latina (recostados à volta da mesa) e não era obrigatório imolar um cordeiro.
Deste modo, os ritos da ceia pascal começavam por se recostarem à mesa, beberem uma 1ª taça de vinho, e o presidente (geralmente o chefe de família) abençoar o vinho e a festa. Depois, traziam os legumes, colocava-se o cordeiro na mesa e bebia-se a 2ª taça de vinho. O filho mais novo perguntava ao pai "Porque é que esta noite é diferente das outras?" e este explicava-lhe que "É em memória do que o Senhor fez por mim, quando saí do Egipto", recordando as palavras de Ex 13,8. Seguia-se o cântico da primeira parte dos Salmos do Hallel (Sl 113-114) e a 3ª taça de vinho era servida aos convivas. Era a vez da acção de graças pela ceia pascal feita pelo presidente e da 4ª taça de vinho. Vinham então os últimos Salmos do Hallel (Salmos 115-118).
Os escritos do Novo Testamento referem 27 vezes a Páscoa de Jesus (Morte e Ressurreição), mas não dizem que Jesus foi ao Templo imolar o cordeiro, pois apresentam-No como Cordeiro pascal que redime toda a Humanidade.
O Evangelho de João é o que melhor apresenta a faceta pascal da morte de Jesus: Jesus foi condenado e morto (imolado) na véspera de sábado, no dia da preparação, a 14 de Nisã (Jo 19,31) e Marcos refere que foi à "hora nona", quer dizer, à hora em que os cordeiros eram imolados em grande quantidade no Templo de Jerusalém. O próprio João Baptista aponta Jesus como "O Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo" (Jo1,29). Lembrando Ex 12,46, o Evangelho de João compara Jesus no alto da cruz ao cordeiro pascal do Antigo Testamento (Jo 19,36). Os cordeiros do Templo eram depois comidos na refeição sagrada da Páscoa, tal como Cristo quis comer a Páscoa com os seus discípulos (Mt 26,18; Mc 14,14; Lc 24,26.46).
A Páscoa de Jeus não foi a simples renovação da Páscoa judaica e bíblica. Cristo celebrou a "Sua Páscoa", na "sua sala", com os "seus discípulos" (Mc14,12-16), pois a Páscoa do Antigo Testamento era símbolo e profecia da Páscoa do Povo da Nova Aliança. Por isso é que na Ceia pascal de Jesus não se refere o cordeiro ou as ervas amargas da ceia pascal hebraica, já que a "Sua Ceia Pascal" tem apenas pão e vinho, comida de todos os dias para dizer que precisamos de O comer todos os dias na Eucaristia. Ele dá a vida como Cordeiro pascal para ser o "Pão da Vida" (Jo 6) de cada dia.
Quando é que os cristãos começaram a celebrar a Páscoa? Há já referências em documentos do século II quando se discute entre as igrejas da Ásia se a Páscoa se devia celebrar no dia 14 de Nisã (Março-Abril) independentemente do dia da semana, contrariamente às igrejas do ocidente que insistiam que a celebração se desse no domingo seguinte ao 14 de Nisã, no dia da Ressurreição de Jesus.
(Adaptado da Revista Bíblica, n 225)

Deste modo, a 10 de Nisã (Março-Abril), as famílias compravam um cordeiro (Ex 12,3) e na noite de 13 para 14 limpavam as casas de todo o pão com fermento, para, no dia seguinte, ao meio-dia, começarem com a preparação da Páscoa, cessando todo o trabalho. Nesse dia 14, entre as 14,30 e as 17,00 horas, os homens entravam no pátio do Templo com um cordeiro que eles mesmos matavam, nos lugares apropriados, enquanto os sacerdotes recolhiam o sangue em vasos que era levado ao altar e aí derramado. As gorduras do cordeiro eram queimadas no altar dos holocaustos, enquanto os levitas, num estrado mais elevado, cantavam os Salmos do Hallel (Salmos 113 a 118). O homem que trouxera o cordeiro levava-o aos ombros para casa, para o assar e comer no banquete pascal, que começava com o aparecimento da primeira estrela.
No dia 15 era a Páscoa propriamente dita e nessa noite começava a festa dos Ázimos com o descanso (que terminava no dia seguinte à noite) e a oferta própria ao Templo. A festa dos Ázimos tinha o seu fim a 21 de Nisã à noite, que também era dia de repouso.
Nem todas as famílias conseguiam ter um cordeiro para imolar e comer e, por isso, juntavam-se várias famílias, convidavam amigos e pessoas pobres, ou juntavam-se pessoas sem grau de parentesco formando "famílias", como foi o caso de Jesus com os seus discípulos para celebrarem a Páscoa (Mt. 26.17-19; Mc 14,12-16; Lc 22,7-13).
No tempo de Jesus alguns dos antigos costumes haviam-se perdido, como o caso das vestes de caminhante (pastor). Comia-se à maneira grega ou latina (recostados à volta da mesa) e não era obrigatório imolar um cordeiro.
Deste modo, os ritos da ceia pascal começavam por se recostarem à mesa, beberem uma 1ª taça de vinho, e o presidente (geralmente o chefe de família) abençoar o vinho e a festa. Depois, traziam os legumes, colocava-se o cordeiro na mesa e bebia-se a 2ª taça de vinho. O filho mais novo perguntava ao pai "Porque é que esta noite é diferente das outras?" e este explicava-lhe que "É em memória do que o Senhor fez por mim, quando saí do Egipto", recordando as palavras de Ex 13,8. Seguia-se o cântico da primeira parte dos Salmos do Hallel (Sl 113-114) e a 3ª taça de vinho era servida aos convivas. Era a vez da acção de graças pela ceia pascal feita pelo presidente e da 4ª taça de vinho. Vinham então os últimos Salmos do Hallel (Salmos 115-118).
Os escritos do Novo Testamento referem 27 vezes a Páscoa de Jesus (Morte e Ressurreição), mas não dizem que Jesus foi ao Templo imolar o cordeiro, pois apresentam-No como Cordeiro pascal que redime toda a Humanidade.
O Evangelho de João é o que melhor apresenta a faceta pascal da morte de Jesus: Jesus foi condenado e morto (imolado) na véspera de sábado, no dia da preparação, a 14 de Nisã (Jo 19,31) e Marcos refere que foi à "hora nona", quer dizer, à hora em que os cordeiros eram imolados em grande quantidade no Templo de Jerusalém. O próprio João Baptista aponta Jesus como "O Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo" (Jo1,29). Lembrando Ex 12,46, o Evangelho de João compara Jesus no alto da cruz ao cordeiro pascal do Antigo Testamento (Jo 19,36). Os cordeiros do Templo eram depois comidos na refeição sagrada da Páscoa, tal como Cristo quis comer a Páscoa com os seus discípulos (Mt 26,18; Mc 14,14; Lc 24,26.46).

Quando é que os cristãos começaram a celebrar a Páscoa? Há já referências em documentos do século II quando se discute entre as igrejas da Ásia se a Páscoa se devia celebrar no dia 14 de Nisã (Março-Abril) independentemente do dia da semana, contrariamente às igrejas do ocidente que insistiam que a celebração se desse no domingo seguinte ao 14 de Nisã, no dia da Ressurreição de Jesus.
(Adaptado da Revista Bíblica, n 225)
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