sexta-feira, 2 de abril de 2010


As festas da Bíblia (V): a Páscoa de Jesus
No tempo de Jesus celebravam-se as três grandes festas nacionais (a Páscoa, o Pentecostes, as Tendas), obrigando à peregrinação até ao Templo de Jerusalém, onde se juntavam mais de 100.000 peregrinos, para além dos mercadores de cordeiros e de outros animais para o sacrifício. Então, seguia-se o antigo ritual da Páscoa dos pastores e dos agricultores.

Deste modo, a 10 de Nisã (Março-Abril), as famílias compravam um cordeiro (Ex 12,3) e na noite de 13 para 14 limpavam as casas de todo o pão com fermento, para, no dia seguinte, ao meio-dia, começarem com a preparação da Páscoa, cessando todo o trabalho. Nesse dia 14, entre as 14,30 e as 17,00 horas, os homens entravam no pátio do Templo com um cordeiro que eles mesmos matavam, nos lugares apropriados, enquanto os sacerdotes recolhiam o sangue em vasos que era levado ao altar e aí derramado. As gorduras do cordeiro eram queimadas no altar dos holocaustos, enquanto os levitas, num estrado mais elevado, cantavam os Salmos do Hallel (Salmos 113 a 118). O homem que trouxera o cordeiro levava-o aos ombros para casa, para o assar e comer no banquete pascal, que começava com o aparecimento da primeira estrela.

No dia 15 era a Páscoa propriamente dita e nessa noite começava a festa dos Ázimos com o descanso (que terminava no dia seguinte à noite) e a oferta própria ao Templo. A festa dos Ázimos tinha o seu fim a 21 de Nisã à noite, que também era dia de repouso.

Nem todas as famílias conseguiam ter um cordeiro para imolar e comer e, por isso, juntavam-se várias famílias, convidavam amigos e pessoas pobres, ou juntavam-se pessoas sem grau de parentesco formando "famílias", como foi o caso de Jesus com os seus discípulos para celebrarem a Páscoa (Mt. 26.17-19; Mc 14,12-16; Lc 22,7-13).

No tempo de Jesus alguns dos antigos costumes haviam-se perdido, como o caso das vestes de caminhante (pastor). Comia-se à maneira grega ou latina (recostados à volta da mesa) e não era obrigatório imolar um cordeiro.

Deste modo, os ritos da ceia pascal começavam por se recostarem à mesa, beberem uma 1ª taça de vinho, e o presidente (geralmente o chefe de família) abençoar o vinho e a festa. Depois, traziam os legumes, colocava-se o cordeiro na mesa e bebia-se a 2ª taça de vinho. O filho mais novo perguntava ao pai "Porque é que esta noite é diferente das outras?" e este explicava-lhe que "É em memória do que o Senhor fez por mim, quando saí do Egipto", recordando as palavras de Ex 13,8. Seguia-se o cântico da primeira parte dos Salmos do Hallel (Sl 113-114) e a 3ª taça de vinho era servida aos convivas. Era a vez da acção de graças pela ceia pascal feita pelo presidente e da 4ª taça de vinho. Vinham então os últimos Salmos do Hallel (Salmos 115-118).

Os escritos do Novo Testamento referem 27 vezes a Páscoa de Jesus (Morte e Ressurreição), mas não dizem que Jesus foi ao Templo imolar o cordeiro, pois apresentam-No como Cordeiro pascal que redime toda a Humanidade.

O Evangelho de João é o que melhor apresenta a faceta pascal da morte de Jesus: Jesus foi condenado e morto (imolado) na véspera de sábado, no dia da preparação, a 14 de Nisã (Jo 19,31) e Marcos refere que foi à "hora nona", quer dizer, à hora em que os cordeiros eram imolados em grande quantidade no Templo de Jerusalém. O próprio João Baptista aponta Jesus como "O Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo" (Jo1,29). Lembrando Ex 12,46, o Evangelho de João compara Jesus no alto da cruz ao cordeiro pascal do Antigo Testamento (Jo 19,36). Os cordeiros do Templo eram depois comidos na refeição sagrada da Páscoa, tal como Cristo quis comer a Páscoa com os seus discípulos (Mt 26,18; Mc 14,14; Lc 24,26.46).

A Páscoa de Jeus não foi a simples renovação da Páscoa judaica e bíblica. Cristo celebrou a "Sua Páscoa", na "sua sala", com os "seus discípulos" (Mc14,12-16), pois a Páscoa do Antigo Testamento era símbolo e profecia da Páscoa do Povo da Nova Aliança. Por isso é que na Ceia pascal de Jesus não se refere o cordeiro ou as ervas amargas da ceia pascal hebraica, já que a "Sua Ceia Pascal" tem apenas pão e vinho, comida de todos os dias para dizer que precisamos de O comer todos os dias na Eucaristia. Ele dá a vida como Cordeiro pascal para ser o "Pão da Vida" (Jo 6) de cada dia.


Quando é que os cristãos começaram a celebrar a Páscoa? Há já referências em documentos do século II quando se discute entre as igrejas da Ásia se a Páscoa se devia celebrar no dia 14 de Nisã (Março-Abril) independentemente do dia da semana, contrariamente às igrejas do ocidente que insistiam que a celebração se desse no domingo seguinte ao 14 de Nisã, no dia da Ressurreição de Jesus.


(Adaptado da Revista Bíblica, n 225)


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